Há muitos anos, em Curitiba, num show do Abominável Sebastião das Neves, a então desconhecida Letícia Sabatella fazia uma campanha contra o extermínio dos cotelês, cuja pele é barbaramente arrancada para se fazer veludo.
Não sei se a empreitada teve êxito, se algum cotelê foi salvo, mas eu me sensibilizei para a causa. Porque é fácil defender golfinhos, pandas, baleias, pererecas - mas quem se importa com esses animais exóticos, ignorados pelo Greenpeace e pelo Discovery Chanel?
Os catupiris, por exemplo. Antes encontrados livremente na natureza, foram praticamente extintos, e hoje são criados em cativeiro, para recheio de coxinhas e empadões, em condições análogas às das maizenas, trituradas (com bico, penas e tudo) para fazer mingau.
Mais cruel ainda é o destino dos náilons, esses laboriosos insetos que, a exemplo do bicho da seda, produzem fios resistentes e de grande valor no mercado têxtil. Mantidos à base de hormônios sintéticos, entretanto, os náilons nunca ultrapassam a fase do casulo, e morrem sem ter jamais criado asas, após produzir quilômetros e quilômetros de fios.
Essa também é a sina das laicras e das viscoses, que jamais saberão o que é voar, e levam uma vida miserável, sob luz artificial e estímulos psicodélicos, para que produzam fios multicoloridos e de alta resistência.
As helancas e os látex, que pertencem à mesma família, são abatidos ainda filhotes, quando sua pele é mais elástica. Alguns produtores chegam a requintes ainda mais desumanos, como a retirada dos bebês poliésters quando ainda estão na bolsa materna, completando a gestação.
No reino vegetal não é diferente. Luta-se pela preservação do pau brasil, do mogno, das madeiras de lei, mas ninguém parece se importar com a extração predatória das fórmicas. Essas árvores brilhantes, que outrora vicejavam na Mata Atlântica, hoje praticamente só existem em monoculturas.
Mais delicados, os couchês, pequenos arbustos de origem francesa, praticamente desapareceram das florestas temperadas, sendo cultivados intensivamente para produção de papel. Se nada for feito para preservá-los, terão o mesmo destino dos almaços, cujos últimos espécimes foram cortados nos anos 80.
Com a demanda estimulada pelo consumo desenfreado, prevê-se para breve o colapso das plantações de sucrilhos e marshmellows, já que as espécies originais foram quase que totalmente substituídas pelas variedades transgênicas, que são estéreis.
Na próxima vez que for comprar um produto, pense em quantos neoprenes foram sacrificados, quantos acrílicos não chegaram sequer a sair do ovo, quantos poliuretanos jamais viram a luz do dia, para que você pudesse se vestir, se calçar.
E você achando que bastava ser vegetariano para aplacar a culpa...